Todo o sistema de saúde angolano, à semelhança de outros sistemas de saúde do Continente africano, são muitos frágeis, o que levou a Organização Mundial de Saúde a pedir especial atenção para ao alastramento na pandemia em África. Hoje, muitos são os que se questionam pelo facto de África não apresentar uma situação tão devastadora como, por exemplo, os países europeus, mais ricos e mais desenvolvidos.
A conversa com médico pediatra Miguel Sebastião aumenta ainda mais a nossa perplexidade, porque, e de acordo com o dirigente do Sindicato dos Médicos, no país falta tudo: recursos humanos, material hospital, medicamentos, material de biossegurança, tudo. Como exemplo, o médico disse que são atribuídas aos médicos máscaras N95 – uma a cada 15 dias.
Outra das preocupações do clínico prende-se com o facto de haver muitos médicos contaminados por covid-19, sendo que os profissionais de saúde deviam ser testados a cada 15 dias, o que não acontece, porque não há testes, mais do que isso, não há material de biossegurança suficiente para todos os médicos.
Falta quase tudo, e faltam, essencialmente médicos. O país precisa de, pelo menos, 30 mil médicos, neste momento, no serviço nacional de saúde estão pouco mais do que seis mil médicos, o que dá um médico por cada cinco mil habitantes.
Com falta de médicos é normal que Angola recrute médicos em outros países, no caso, em Cuba. O secretário-geral do Sindicato dos Médicos não tem nada contra essa contração de médicos cubanos, que são “bem-vindos”, diz, o que o choca, e acha mesmo que se enquadra numa questão de falta de respeito, é ouvir a ministra da Saúde Sílvia Lutucuta dizer que se paga aos médicos cubanos cerca de cinco mil dólares por mês, enquanto os médicos nacionais ganham entre 250 a 260 mil kwanzas por mês, ainda por cima numa situação limite, a atenderem para cima de 100 doentes por dia.
Outra das questões para que o médico pediatra chamou a atenção, é para a falta de cuidados médicos nas periferias, o que faz com que os hospitais centrais estejam permanentemente cheios, pondo em causa a saúde de todos e as condições do atendimento médico. Outra das denúncias que o dirigente sindical fez, tem a ver com a alta taxa de letalidade que a covid-19 está a provocar entre a classe médica – em seis meses morreram uma dezena de médicos devido ao novo coronavírus. E não há um cadastramento dos médicos que fazem parte dos grupos de risco – diabéticos, hipertensos, e outras comorbilidades em caso de infecção, sendo que esses mesmos médicos continuam no activo.
Finalmente, e sobre a posição do Sindicato dos Médicos relativamente à actual bastonária da Ordem dos Médicos Angolanos, Elisa Pedro Gaspar, Miguel Sebastião considera que a classe não se revê na bastonária e menos ainda na sua gestão da ordem. Para os médicos que representa – a sua maioria está na ordem regional do norte, que representa cerca de 70% dos médicos em Angola – Elisa Pedro Gaspar já não é bastonária, é, antes, alguém que resiste mas “que acabará por se afogar”, ou seja, acabará por ser formalmente destituída do cargo e a sua gestão à frente da Ordem dos Médicos de Angola deverá ser investigada.