Economia

Uma guerra dois vencedores – José Inácio

Facto é, estamos há quase um ano de um conflito intenso, com avanços e recuos militares dos dois lados, numa cifra de cerca de 42 295 vítimas humanas, danos materiais na ordem dos 350 mil milhões de dólares americanos, milhões de deslocados e uma narrativa voltada para ajuda militar direita, longe de um discurso pacificador europeu do qual estamos acostumados a ouvir, que exacerba a cada dia mais o conflito. Apesar das incertezas, podemos constatar que os vários cenários vislumbrados no status quo vigente na Europa, como as sanções, ajudas militares, e visitas estatais, levantam questões como, qual é o objectivo do pacote de ajuda das potencias ocidentais? quando terminará a guerra? Quem se sairá vencedor? Poderá a guerra terminar à 24 de Fevereiro de 2023?

Desde o ano de 2013, a Rússia tem demonstrado fortes indícios de receio da concretização do alastramento da Organização do Tratado Atlântico Norte (OTAN) para o Leste, cuja proeminência já era visível, através do Soft Power europeu que alicia a Ucrânia, de modos a cooptar-la para adesão ao Bloco europeu e consequentemente para a OTAN. Com efeito, tal manobra poderia permitir a construção de uma base militar da OTAN na Crimeia, o que impossibilitaria a Rússia de efetuar manobras militares no mar Negro. Todavia, impulsionado por este receio, Vladimir Putin decidiu anexar a Crimeia, em Fevereiro de 2014, garantindo desse modo que estava assegurada a posse do porto de Sevastopol, ou seja, a segurança da Rússia.

Com a anexação da Crimeia em 2014, a crise começava a agudizar-se, tendo sido acentuada com a diminuição da esfera de influência russa na Ucrânia, traduzida na queda do governo pró-russo de Victor Yanukovych, na esteira do Euromaidan e na consequente eleição de Petro Poroshenko, que decididamente posicionou-se como um nacionalista ferrenho, que quis alinhar os intentos da Ucrânia aos da União Europeia, mesmo sabendo que tal façanha pudesse despoletar uma guerra sem precedentes, cujo marco foram os fracassados acordos de Minsk.

Na sequência, emerge um completo anónimo no metiê político ucraniano, que decidiu dar vida ao seu personagem da série televisiva The servant of the people, com uma propaganda política forte e bem delineada e um nível de aceitação surpreendente, Volodomir Zelensky assumia a liderança da Ucrânia em 2019 com 73% dos votos.

O cenário estava montado e os sinais de que a Ucrânia tivera sido seduzida pelo Soft power europeu eram visíveis, por isso Putin posicionou-se face ao avanço do seu rival direito EUA (OTAN) através de uma manobra dissuasiva com 130 mil soldados junto da fronteira com a Ucrânia, que veio a concretizar em 24 de Fevereiro de 2022, o Hard power russo, traduzido na invasão militar, para estancar qualquer possibilidade de adesão da Ucrânia à UE, bem como na OTAN.

A Operação Militar Especial, tinha como foco dirigir-se para Kiev, com o intuito de derrubar o governo eleito de Zelensky, porém debateu-se com uma linha de defesa destemida que obrigou a Rússia a recuar a norte e focar o seu emprenho militar na Frente Leste, propriamente na região do Dombas (Lughansk e Donetsk).

Para fazer face à Rússia, a Ucrânia contou com o apoio da União Europeia e dos EUA, que impuseram um pacote de sanções para enfraquecer, economicamente, à Rússia com maior destaque para retirada da Rússia do sistema SWIFT (Society for Worldwide Interbank Financial Telecomunication) o que condicionou as transações financeiras para a Rússia, como também a inoperatividade do Nordstream, um pipeline que abastecia gás natural para a Europa Ocidental, decorrente de uma sabotagem, que Seymour Hersh atribui a responsabilidade do ato aos EUA, apesar destes culpabilizarem a Rússia.

Não obstante as sanções, foram enviados para Ucrânia pacotes de ajuda militar, sobretudo dos EUA, com armamento de grande porte capaz de causar baixas significativas ao adversário, por consequência a Rússia viu-se obrigada a reformular a sua ofensiva militar, assim como orientar uma mobilização abrangente de soldados e até mesmo considerar a actuação de mercenários, gerando uma escalada maior do conflito.

No quadro da escalada do conflito, assistimos na Europa uma mobilização frenética para o envio de tanques de guerra Leopard 2, de fabrico alemão, além do Leclerc de fabrico francês e o inglês Challenger, para à Ucrânia como parte do chamado pacote de ajuda europeu, alinhado a defesa de posição da Ucrânia, não somente para garantia da integridade territorial deste, mas também para que a Operação Especial Militar russa, não transcenda as fronteiras ucranianas e desemboque além das fronteiras do bloco europeu. Outrossim, tem que ver com os esforços conjugados pelos EUA, que se comprometeram com o envio do M1 Abrams, no âmbito do seu decimo nono pacote de ajuda enviado para Ucrânia, para permitir a defesa e a reconquista dos territórios perdidos no avanço russo.

Por seu turno, Zelensky solicita o envio de caças F-35, para estancar o avanço russo, porém o envio deste tipo de arsenal poderá originar uma escalada ainda maior do conflito, com consequências sem precedentes, e por este facto poderá essa solicitação não vir a ser atendida.

Neste sentido o conflito atingiu um ponto de saturação para ambos lados, com escassez de meios (munição e armamento), fatiga das tropas, o que de certo modo começa a evidenciar o aproximar do fim do conflito. No entanto, o desfecho desta guerra, depende essencialmente do fim do suporte militar para Ucrânia, quer seja da NATO, União Europeia e dos Estados Unidos da América, quer seja da China, India e Bielorussia para os Russos.

Contudo, a Ucrânia não poderá vencer a Rússia no campo militar, sob pena deste último usar um tudo ou nada, por sua vez a Rússia não poderá assinar um acordo de paz, pois estará a assumir uma derrota militar face a Ucrânia.

Portanto, a guerra poderá terminar em 24 de Fevereiro de 2023, com a Ucrânia a declarar unilateralmente a paz, com o suporte da União europeia, enquanto a Rússia devasta as posições militares ucranianas e assumi regiões estratégicas no Leste, isto é, a Ucrânia venceria no campo político (sem aderir a EU por enquanto) e a Rússia no campo militar (com a garantia de segurança) o que configuraria uma guerra e dois vencedores.

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