A Nigéria vive há cerca de dez dias no maior tumulto. Esta quarta-feira, dia 21 de Outubro, milhares de manifestantes voltaram a sair às ruas exigindo o fim da brutalidade policial – no dia anterior, na terça-feira, dia 20, milhares de jovens desafiaram o recolher obrigatório e manifestaram-se no distrito de Lekki, em Lagos, a capital económica da Nigéria, contra a brutalidade das forças de segurança, que reagiram disparando sobre os manifestantes. Não há certeza sobre o número de mortos, nem sequer sobre o número de feridos.
O governador de Lagos, Obajide Sanwo-Olu, fala em dezenas de feridos sendo que tem dificuldade em reconhecer que há mortos – fala num morto. A Amnistia Internacional e o alto comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos afirmaram que as forças policiais nigerianas são responsáveis várias mortes entre os manifestantes. Os números apontam para mais de duas centenas. O governo decretou o recolher obrigatório, mas isso não tem impedido nos jovens de se manifestarem e a polícia de carregar sobre os manifestantes, não só em Lagos como em outras cidades do país, como Abuja, a capital.
As manifestações surgiram em consequência de um vídeo divulgado há cerca de duas semanas, onde se via um homem a ser espancada por polícias especiais do Esquadrão anti-roubo, também conhecido como SARS. Os jovens nigerianos, em resposta, criaram o movimento #EndSARS. Entretanto, o governo anunciou que desmantelaria a unidade policial, que a Amnistia Internacional diz ser responsável por muitas casos de tortura e homicídio. Ainda assim, as garantias do governo não aplacaram a raiva incontida dos manifestantes, que exigem por estes dias amplas reformas para acabar com os abusos dos direitos humanos cometidos pelas forças de segurança nigerianas bem como pelo fim da corrupção generalizada do governo. Aquela que é uma das maiores economias da África subsaariana, com mais de 200 milhões de habitantes, enfrentam altos níveis de pobreza e carece de uma enormidade de serviços básicos.
A violência na Nigéria tem chamado a atenção da comunidade internacional, em repúdio, já se manifestaram o candidato democrata às eleições norte-americanas, Joe Biden, e Beyoncé. Wole Soyinka, nigeriano e Prémio Nobel da Literatura, afirmou “os factos são indiscutíveis, os militares, abriram fogo contra civis desarmados” e o exército deve pedir desculpa por isso, “não apenas à nação, mas à comunidade internacional”.
As Nações Unidas e a União Europeia condenaram já a brutalidade policial na Nigéria e exigiram a responsabilização dos autores da repressão e da violência policial. O porta-voz do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, em seu nome, apelou ao “fim da brutalidade e dos abusos policiais na Nigéria”. António Guterres “insta as forças de segurança a terem sempre a máxima contenção, apelando aos manifestantes para que protestem pacificamente e se abstenham de quaisquer atos de violência”. Por seu lado, o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, condenou a repressão sangrenta ocorrida em Lagos. “É alarmante saber que várias pessoas foram mortas e feridas durante as manifestações” contra a violência policial, disse Josep Borrell, para acrescentar que “é crucial que os responsáveis por estes abusos sejam levados à justiça e obrigados a prestar contas”.