Poder

Não pode haver amnistia para os filhos mais velhos do antigo presidente, a menos que haja um “atropelo” legal

DR

DW África: Acredita que poderá ser concedida uma amnistia geral aos filhos mais velhos de José Eduardo dos Santos, como os próprios defenderam numa carta divulgada esta terça-feira?

Agostinho Canando (AC): Não acredito que possa haver uma amnistia geral aos filhos do antigo Presidente da República. Na carta, esta é apenas uma das propostas colocadas em cima da mesa para negociar com o Governo angolano. Restará saber qual a contraproposta do Executivo. Legalmente, creio que não haverá qualquer amnistia, porque uma coisa são os processos criminais, que foram ou estão a ser intentados contra os filhos do ex-Presidente da República, e outra coisa – muito diferente – é a vida civil e privada de José Eduardo dos Santos, sobre a qual se poderia chegar a uma negociação. Mas aposto que não será aceite uma amnistia em troca de um funeral condigno em Angola, salvo se houver algum atropelo [legal].

DW África: Tem-se defendido que uma amnistia serviria para amenizar os ânimos no seio do MPLA. Realizar o funeral de José Eduardo dos Santos em Angola, com a presença dos filhos, seria positivo para a imagem do Presidente João Lourenço e do próprio partido no poder, que tem manifestado alguns sinais de divisão?

AC: Seria positivo para João Lourenço, não só como Presidente da República, mas também na qualidade de presidente do MPLA. Mas limpar a imagem do Presidente da República pode implicar sujar a imagem do Estado angolano.

DW África: Os filhos mais velhos do ex-Presidente dizem que aceitam o funeral, mas só depois das eleições gerais de 24 de agosto. Do ponto de vista legal, os filhos podem impor condições?

AC: Em princípio, quando se trata de questões familiares, é a própria família que tem a primeira palavra. Mas José Eduardo dos Santos não era apenas pai, foi também Presidente da República, e há pressupostos a serem cumpridos. Os filhos deveriam ter isso em mente. É claro que, para que o funeral seja depois de Agosto, deverá haver negociações, mas aposto que o Presidente da República não vai querer que isso aconteça, porque há a hipótese de ele perder nas eleições. Caso isso se concretize, seria um outro Presidente a dar um enterro condigno a José Eduardo dos Santos.

DW África: Os filhos também alegam que a campanha eleitoral compromete as exéquias. Concorda?

AC: Apesar de estarmos a viver um período de luto nacional, não é acertado dizer que a campanha eleitoral atrapalhará as exéquias. A vida continua, a campanha vai continuar. Se as exéquias decorrerem em Angola, pode dar-se o caso de, naqueles dias, não se realizarem atividades político-partidárias de massas. Mas acho que não vai atrapalhar.

DW África: Acredita que poderá estar para breve a resolução desta disputa judicial relativamente à entrega do corpo do ex-Presidente? Ou poderá demorar? Em Espanha, foram pedidos mais exames, apesar da autópsia inicial ter dito que José Eduardo dos Santos morreu de causas naturais.

AC: Os filhos querem colocar em primeiro lugar os seus interesses e da família. Isso é natural. Mas o Presidente da República também quer que os seus interesses, e os interesses da Nação, estejam em primeiro lugar. Não creio que o fim desta disputa esteja para breve, até porque coincidiu com uma época de pré-campanha eleitoral. Uma das filhas de José Eduardo dos Santos, Tchizé dos Santos, alega que só pretende que o funeral seja realizado em Angola depois das eleições, mas não creio que o Presidente da República, quer na qualidade de chefe da Nação, quer na qualidade de presidente do maior partido no país, o MPLA, irá aceitar tal condicionalismo. Por isso, esta luta poderá demorar; poderá até acabar só no próximo ano. Em Angola, temos também a velha problemática da morosidade processual. Se um processo penal ou laboral, que em princípio deveria demorar dois ou três meses, demora dois anos, imagine um processo civil como este, de caráter político – provavelmente vai levar um a dois anos.

Related Articles

Back to top button