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E porque Angola é um país soberano condena a anexação do Donbas pela Rússia

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Na primeira fase do conflito desencadeado pela invasão da Ucrânia pela Rússia, em Fevereiro, Angola, ao lado de muito países africanos, absteve-se na votação na Assembleia-Geral das Nações Unidas que condenou a Rússia por essa acção, mas acabaria por alterar a sua posição e em Outubro, e depois de um referendo, e quando a Rússia formalizou a anexação de quatro regiões no Donbas, em nova votação na Assembleia-Geral, Angola votou a favor da resolução que condenava a anexação dos territórios ucranianos pela Rússia.

O Presidente foi questionado sobre o assunto pela Voz da América. O jornalista lembrou das boas relações entre Luanda e Moscovo e que tentou perceber se há uma mudança na política externa angolana, mas João Lourenço respondeu: “primeiro é preciso que fique claro que nós somos um país soberano e um país soberano define a sua política externa, portanto, como país soberano, nós entendemos que devíamos condenar a anexação daquelas quatro regiões do Donbass, na Ucrânia”.

E depois explicou porquê: “Angola é dos países que atravessou um dos períodos mais longos de guerra na sua história, mais do que muitos povos, tivemos 27 anos de conflito armado, portanto, nós sabemos o que é uma guerra, nós fomos vítimas de uma agressão externa, ou seja, uma invasão militar por parte do regime do ‘apartheid’, na altura, foi então a União Soviética quem nos forneceu armamento, equipamento, aviões, tanques, artilharia, etc, que nos permitiu, portanto, fazer frente ao todo poderoso exército sul-africano e pará-los ali, no Cuíto Cuanavale”.

Alargou a sua explicação com base na História recente de Angola à retirada dos sul-africanos, à libertação de Nelson Mandela e a independência da Namíbia e ” por tudo isso é que digo que se nós lutamos contra os invasores entendemos que todos os outros povos estão no mesmo direito do fazer”, disse isto para reiterar que Angola votou a favor “dessa resolução que condena a anexação dessas quatro regiões de forma consciente, de forma soberana, não fomos forçados a fazê-lo por ninguém, absolutamente ninguém, entendemos que a postura mais correcta, mais séria, seria aquela e assim aconteceu”.

João Lourenço também não vê a Cimeira EUA-África como um sinal de afirmação de Washington no Continente africano ou como forma de manter um certo equilíbrio relativamente à influência russa ou chinesa, e põe de parte a ideia de uma nova Guerra Fria tendo por palco o Continente africano.

Para o presidente angolano a Guerra Fria é um fenómeno global, que existe ou não existe, mas não passa por um só continente, e vai ainda mais longe: “Esse conceito de Guerra Fria em África não existe, estamos no mundo globalizado, em que há espaço para todos, podemos assim dizer, portanto, não se pode dizer que o Continente africano deve ficar refém de uma só potência, em política isso não existe”, disse João Lourenço.

O Presidente angolano considera, por outro lado, que não há um domínio chinês em África. “Existe o falso receio do domínio chinês do Continente africano, eu digo falso (…) porque a presença chinesa, que nós conhecemos em África, é sobretudo a de crédito para investimentos públicos, em que as empresas chinesas, suportadas por bancos chineses, públicos ou privados, na maioria públicos, vão para África executar empreitadas de infra-estruturas públicas, portanto, nós não conhecemos grande investimento privado chinês no Continente africano (…) o domínio da África pela China aconteceria se houvesse um grande investimento privado chinês em África, isso não existe, o que existe são execução de empreitadas, de infra-estruturas públicas, que acabam por ser propriedade dos Estados africanos, que ficam endividados perante a China”, sendo que depois fica o compromisso de cada Estado de pagar essa dívida (e há alguns Estados africanos que não o têm conseguido).

E por falar em dívida, e sendo a China um dos maiores credores de Angola, o Presidente assumiu que houve uma renegociação dos termos da dívida – nunca totalmente divulgados -, em 2019 (na realidade foi em 2020/2021, no contexto da pandemia), e que essa renegociação “não foi de forma isolada” mas que “envolveu as principais instituições financeiras internacionais como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional ou o “clube de Paris”, e, portanto, a China como membro dessas instituições acabou por se associar”.

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