Economia

Álvaro Sobrinho pode estar de volta ao Banco Económico (de onde nunca saiu)

O Banco Económico, criado a partir dos despojos do BESA (Banco Espírito Santo Angola), em 2014, é, e à semelhança do banco que esteve na sua origem, uma instituição financeira pouco sã.

A Deloitte Angola apresentou, na semana passada, em conferência pública, em Luanda, o relatório Banca em Análise 2021 – (R)Evolução no sector bancário em Angola, incluindo todos os bancos do sistema financeiro angolano, menos de um: o Banco Económico.

Tanto o economista e jornalista Carlos Rosado de Carvalho, como o jornalista Joaquim Reis, do semanário Expansão, um jornal de referência na imprensa económica angolana, e com quem falamos, se confrontam com a falta de informação da instituição bancária reerguida a partir dos “escombros” do Banco Espírito Santo em Angola. Um e outro admitem que só podem especular, porque a última vez que o Banco Económico tornou as suas contas públicas, apesar da legislação específica sobre o assunto, foi em 2019, altura em que se iniciou o processo de reestruturação.

Em Maio deste ano, a Assembleia Nacional de Angola aprovou uma nova Lei do Regime Geral das Instituições Financeiras, um extenso articulado que dotou o Banco Nacional de Angola (BNA), o regulador, de maior capacidade “interventiva”, “infraccional” e “sancionatória”. E é agora o BNA que está a preparar uma resolução com vista à recapitalização do Banco Económico, em cuja estrutura acionista ainda está o Novo Banco com 9%, a que se acrescenta o general Leopoldino Fragoso do Nascimento “Dino”, através da Geni – Novas Tecnologias, com 19,9%, e o Estado angolano, através da Sonangol, com 70,38% – o que também resulta da entrega das participações detidas por Manuel Vicente e pelo general Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, activos cujos valores nunca foram detalhados.

O Banco Económico foi e é um “banco dos marimbondos”, expressão grafada pelo Presidente João Lourenço, ou, usando uma linguagem mais formal, de PPEs (Pessoas Politicamente Expostas). A regeneração do banco passa, e mais uma vez, por um processo de regeneração do regime a partir de dentro, num processo que será sempre complexo. O primeiro presidente do Conselho de Administração do Banco Económico foi António Paulo Kassoma, numa altura em que, cumulativamente, foi secretário-geral do MPLA, o partido do poder em Angola desde 1975.

Também por isso, o vice-governador BNA, Rui Miguéns, usa de todo o cuidado para se referir ao assunto. Igualmente esta semana, e no final da conferência da Deloitte, Minguéns adiantou que banco central está a ultimar a solução para a recapitalização do Banco Económico, não disse quando, mas assegurou que será ainda este ano.

Carlos Rosado de Carvalho adiantou que, e por pressão do Fundo Monetário Internacional (FMI) – recorde-se que Angola está sob intervenção de um Extended Fund Facility -, o BNA tem até ao final deste mês de Julho para apresentar um plano de resolução. Neste momento, o que se passa no Banco Económico é um segredo partilhado entre o banco, o regulador e uns quantos happy few – ou nem por isso!

Rui Miguéns adiantou que os valores necessários, que foram calculados com base na Avaliação da Qualidade de Ativos (AQA), promovida em 2019 pelo BNA, precisam de ser constantemente reavaliados, mas sem referir os montantes. “No que diz respeito ao programa de recapitalização, temos uma ideia de como o banco poderá ser recapitalizado. Estamos a concluir esse estudo e muito brevemente daremos notícia, a solução ainda está a ser calibrada para percebermos todos os contornos” acrescentou o vice-governador do BNA.

A Moody`s fez recentemente uma revisão em baixa o rating do Banco Económico, que passou para Caa3, pelo tempo que a instituição bancária está a levar para finalizar o processo da sua recapitalização, justificado por “factores exógenos”.

Em tempos, Álvaro Sobrinho, administrador do BESA e o homem em quem Ricardo Salgado confiava, não pode ou não quis impedir perdas de cerca de 300 milhões de dólares, e saiu da administração do BESA, mas pode estar de volta, não porque queira, mas porque não pode dizer que não a uma eventual resolução imposta pelo Banco Nacional de Angola que passa por um bail-in – a transformação dos grandes depositantes do banco em acionistas.

A situação é de enorme embaraço para os próprios e para o poder político angolano, na órbita do qual gravitam e sempre gravitaram, uma vez que muitos deles se sentem forçados a alinharem numa solução que lhes é imposta. E a solução, que não é boa para os depositantes forçados a serem acionistas, também pode não ser suficiente para o Banco Económico. Carlos Rosado de Carvalho não deixou de chamar à atenção para o facto de o banco precisar de liquidez imediata, numa altura em que o Estado está impedido pelo FMI de o fazer, e porque não tem dinheiro, e que a transformação dos depósitos em participações pode não ser suficiente.

Joaquim Reis, por sua vez, opta para chamar a atenção para a origem dos depósitos, isto é, a transformação dos depósitos em participações pode ser uma forma de branquear capitais.

A este propósito, e no passado mês de Junho, o Correio da Manhã publicou uma lista de grandes devedores do BESA, que, e no seu conjunto, em Agosto de 2013, perfaziam dívidas no valor 6,8 mil milhões de dólares, sendo que 550 milhões foram levantados em cash. Entre os grandes devedores está Álvaro Sobrinho, que é investigado pelo Ministério Público português através do processo 244/11, e que foi presidente do BESA entre 2001 e 2012. Sobrinho tem (teve) uma dívida de 81,26 milhões de dólares.

O maior devedor do BESA, com 226,75 milhões de dólares, é a Ocean Private de Manuel Seixas Afonso Dias e de Emanuel Madaleno, o cunhado e o irmão de Sobrinho. E Álvaro Sobrinho surge de novo na lista com uma outra dívida no valor de 63,70 milhões de dólares, através da Grunberg Investments Limited, sociedade referenciada nas Ilhas Virgens Britânicas, de que é beneficiário, e de acordo com outra investigação do Ministério Público português, o processo 324/14. Se parte ou o todo destes valores estiverem depositados no Banco Económico serão licitamente integrados no processo de bail-in.

Em 2013, Ricardo Salgado escrevia a José Eduardo dos Santos, o então Presidente de Angola, lamuriando ou lamentado, que Álvaro Sobrinho, enquanto administrador do BESA, não tinha tido “uma efetiva vontade ou capacidade de resolver os problemas de crédito criados pela sua própria gestão”. Agora, com o Presidente João Lourenço no poder, o antigo BESA, hoje Baco Económico, continua a ser um problema para Álvaro Sobrinho, mas, e desta vez, a que não pode voltar as costas.

Carlos Rosado de Carvalho admitiu, na conversa com tivemos disse ainda que em 2014, quando o banco foi intervencionado – e quando o BES perdeu a maioria das participações, passou de 55% para 24% e mais tarde para 9% – que se foi ao pote com muita sede. E o processo que nasceu torto, nunca se endireitou.

A pandemia adiou de 2020 para 2021 o plano de reestruturação, mas, garantem-nos, de 2021 não passa, numa altura em que o Banco Económico, que é um banco sistémico – esteve ou estava entre os cinco maiores bancos angolanos – mais parece um banco “zombie”, nas palavras de Joaquim Reis.

Quanto à possibilidade de a solução do banco passar por um fundo de resolução, no qual participariam outros bancos com o aval do Estado angolano, o jornalista do Expansão acha que essa solução é muito pouco provável, senão impensável, “não há dinheiro”, disse-nos Reis. O “Estado não tem dinheiro”, corrobora Rosado de Carvalho. E o Banco Económico pode precisar de 600 milhões de dólares, tudo contas muito por alto.

Entretanto, a possibilidade de Sobrinho voltar ao Banco Económico, ao lugar onde foi quase feliz, porque sempre afirmou que o colapso do banco, então BESA, tinha mais a ver com questões políticas do que com uma questão de gestão, provoca agitação e inquietação em Luanda. A idoneidade é um dos principais pressupostos na avaliação e aprovação dos acionistas bancários, e Álvaro Sobrinho, ontem como hoje, tem tido a sua idoneidade posta em causa, mas no caso do Banco Económico, dos dez maiores depositantes, quase todos PPEs, a questões de idoneidade terão de ser bastante flexíveis.

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