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O documento, a que a agência Lusa teve acesso e que será apresentado hoje à noite numa videoconferência organizada pelo canal digital Camunda News, considera dois cenários para a votação.
“O primeiro, e mais provável, é que o MPLA vença as eleições, manipulando as instituições eleitorais e de justiça e beneficiando-se da parcialidade. Isso pode causar uma revolta popular que poderia descambar em violência pós-eleitoral. O segundo cenário, menos provável, é uma vitória da UNITA, o que levaria a alguns grupos conservadores no seio do MPLA a recusarem transferir o poder”, lê-se no documento, escrito por Borges Nhamirre, jurista e investigador no Centro de Integridade Pública de Moçambique e consultor do ISS.
“A mediação será necessária para evitar um provável conflito violento pós-eleitoral”, reitera o autor do documento.
Intitulado “Eleições livres e justas? O campo desnivelado de Angola”, o relatório defende que o governo do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), no poder desde a independência em 1975, “enfrenta séria oposição”.
“No entanto, o cenário político altamente desigual ainda favorece o partido no poder. Votações livres, justas e credíveis dependerão da aplicação dos princípios e diretrizes da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC, na sigla em inglês).
Segundo Borges Nhamirre, as eleições vão realizar-se “num cenário altamente desigual que favorece o partido no poder [MPLA]. A imprensa estatal é controlada pelo Governo e pelo partido no poder, e muitas vezes publica informações que lhes são favoráveis. O Tribunal Constitucional [que tem competência constitucional de tribunal eleitoral] já provou que é partidário, adotando decisões que prejudicam os partidos da oposição e seus candidatos”.
O consultor do ISS denuncia, por outro lado, que as recomendações feitas nas anteriores eleições, em 2017, pela Missão de Observação Eleitoral a Angola da SADC e pelo Observatório Eleitoral de Angola “ainda não foram postas em prática”.
Outra recomendação que não foi seguida pelas autoridades angolanas tem a ver com a elaboração da lista de eleitores, a cargo do Ministério da Administração do Território que, por ser um departamento governamental, “contraria as recomendações da SADC”, destaca Borges Nhamirre.
Relativamente à observação eleitoral, o relatório recorda que a Comissão Nacional Eleitoral (CEN) impôs um máximo de 2.000 observadores nacionais para monitorizar mais de 26.480 assembleias de voto, incluindo a diáspora.
Para Borge Nhamirre, o limite de três observadores credenciados por organização não-governamental (ONG) por cada uma das 18 províncias de Angola “impedirá” que estas organizações “realizem um apuramento paralelo adequado de votos”.
As recentes alterações legais que foram aprovadas pelo parlamento, onde o MPLA tem a maioria confortável correspondente aos 61,07% obtidos em 2017, e que estipularam que a contagem dos votos será, desta vez, feita em Luanda, “são altamente problemáticas e minam a responsabilidade e a transparência”.
Nas recomendações que apresenta no relatório, Borges Nhamirre distribui-as pela União Africana (UA) e comunidade internacional, SADC e Governo de Angola.
À UA e comunidade internacional recomenda que urjam o governo angolano “a respeitar a liberdade de expressão e os Direitos Humanos e evite cortar o acesso à Internet durante a votação e protestos”.
À SADC, que “exorte o governo angolano a aplicar as recomendações da Missão de Observação Eleitoral (…) que permita a validação independente da lista de eleitores”.
Borges Nhamirre recomenda ainda à SADC que exorte tanto o MPLA como a UNITA e outros partidos e coligações “a evitar discursos de ódio que possam incitar a violência”.
Ao Governo de Angola, Borges Nhamirre pede que “deixe de instrumentalizar a imprensa estatal” e assegure que as autoridades de gestão eleitoral “respeitem a lei e a Constituição e pratiquem a transparência para garantir a confiança dos candidatos e cidadãos”.
A última recomendação ao Governo de Angola é que “permita à população comentar livremente o processamento e transmissão dos resultados das eleições” e que sensibilize a CEN para “eliminar a barreira” de 2.000 observadores angolanos e autorize a monitorização e observação das eleições