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Todos os instrumentos de check and balance são dominados pelo MPLA

Adalberto Costa Júnior respondeu, durante quase duas horas, às questões colocadas pelos jornalistas João de Almeida e Graça Campos, na Rádio MFM, sem acrescentar nenhuma novidade aquele que tem sido o seu discurso político de âmbito partido, como líder do maior partido da oposição, sistematizando as preocupações do UNITA, que estende a todos os angolanos, e insistindo no excessivo poder do Presidente da República e no controlo das todas as instituições de check and balance pelo partido do poder, tarefa que vai para além da Assembleia Nacional onde o MPLA tem uma maioria qualificada de dois terços dos deputados – 150 em 220.

Também por isso, a actual proposta de revisão da Constituição, a debater na generalidade esta semana, só podia ter sido apresentada pelo Presidente da República ou pelo partido de que é presidente, o MPLA.

Mas antes de falar do tema do momento, digamos assim, da revisão constitucional, Adalberto da Costa Júnior começou por mostrar a maior disponibilidade para dialogar para o diálogo com a Presidência do país. Lamento que haja “claramente falta de diálogo” por parte do poder, e diz que gostaria que se “olhasse para o presidente da UNITA como um parceiro” e com ele “trabalhar para o interesse nacional”.

Revisão da Constituição: artigos ad hominem

O presidente da UNITA lembrou o encontro que teve, em Fevereiro de 2020, com o actual Presidente da República, passados um par de meses depois de ele próprio ter sido eleito líder do partido, e das propostas que apresentou, entre elas, a reforma do Estado, que passava pela revisão do sistema eleitoral, da Comissão Nacional Eleitoral e a implementação do processo autárquico e propostas para uma revisão da Constituição.

Adalberto da Costa Júnior adiantou que o Presidente da República lhe respondeu por escrito – num documento extenso, de que por questões de ética e decoro político se absteve de revelar pormenores – mas adiantou que na resposta do Presidente ao líder da UNITA, João Lourenço não se referiu a qualquer proposta de revisão da Constituição. Aliás, lembrou Costa Júnior, sempre que se falou do assunto – e os jornalistas sempre que o puderam entrevistar insistiram no tema – o Presidente João Lourenço ou admitia que essa tarefa não lhe cabia ou considerava que a revisão da Constituição não lhe parecia uma tarefa prioritária.

Também por isso, Adalberto da Costa Júnior considera que se a proposta surgiu agora por “puro oportunismo político”, em vésperas de ano eleitoral.

O líder do maior partido da oposição não contesta só o tempo, mas também o lugar – no Conselho de Ministros – e a falta de diálogo com a sociedade. Adalberto da Costa Júnior defende que os assessores do Presidente falharam, não o deviam ter deixando avançar com a proposta sem que antes “de forma tranquila” tivesse feita uma auscultação da sociedade.

O presidente da UNITA deixou ficar a ideia que o seu partido vai debater algumas questões que lhe parecem sérias nas quarenta proposta da “revisão pontual da Constituição”, mas, pragmático, deu a entender que não há espaço para grandes alterações por duas razões, primeiro pela própria limitação do seu partido, não há como contraria a maioria qualificada do MPLA na Assembleia Nacional e depois porque teme, ideia implícita, que o arrastar do debate possa pôr em causa o calendário eleitoral, lembrando, que ainda cabe ao Presidente da República, e de acordo com os termos da actual Constituição, marcar a data das eleições

Na proposta apresentada pode ler-se “sem prejuízo do disposto no número 3 do artigo 132.º, as eleições gerais realizam-se na terceira semana de Agosto do ano em que terminam os mandatos do Presidente da República e dois deputados à Assembleia Nacional, cabendo ao Presidente da República definir a sua data”, temos, então, que de acordo com a nova proposta a decisão do Presidente tem uma baliza temporal muito definida, o que Adalberto não disse, mas deu a entender, porque o sublinhou que o mandato actual é de cinco anos, é que o prazo de cada mandato pode ser revisto.

O líder da UNITA acusa o Presidente da República de uma “dialéctica pouco séria” na apresentação da proposta de revisão constitucional e estranha mesmo que competentes membros do governo em matéria constitucional tenham igualmente uma postura pouco séria na questão.

Mas, insiste o líder da UNITA, “o momento é inapropriado, estamos em pré-campanha eleitoral”, também por isso alerta que é natural que as pessoas olhem com “desconfiança” para esta proposta de revisão constitucional. E esse é o aspecto negativo de tudo este processo, caso assim não fosse, a UNITA teria aplaudido a iniciativa do Presidente da República.

Adalberto da Costa Júnior lembrou ainda que foi o MPLA que pôs em causa alguns dos aspectos do texto constitucional e por isso cabe ao MPLA corrigir esses mesmo desvios – e subentende-se aqui a existência do célebre acórdão 319/13 do Tribunal Constitucional iniciativa suscitada por deputados do MPLA que põe em causa o papel fiscalizador do parlamento.

Seja como for, Adalberto Costa Júnior não deixou de sublinhar que, e também de acordo com a Constituição, o desempenho do Presidente da República não é escrutinável por nenhum mecanismo. O poder do Presidente é inquestionável, ainda mais quando o partido que o elegeu tem a maioria no parlamento. A presença do Presidente na Assembleia Nacional não está prevista, a menos que seja da sua vontade, e não está prevista nenhuma forma de moção de censura ao Executivo. Também por isso, a UNITA insiste em falar dos “poderes excessivos” deste sistema de “presidencialismo puro”, e aqui pode ler-se a ideia de um certo “caudilhismo” ou de pressupostos mais autocráticos.

Adalberto Costa Júnior referiu-se ainda ao artigo 110.º, que trata de inelegibilidades e impedimentos e que ao comparar as inelegibilidades dos deputados às do Presidente da República – renuncia de mandato – visa atingir, em concreto, uma pessoa: Abel Chivukuvuku – que renunciou ao seu cargo de deputado em 2017, quando foi eleito como cabeça de lista da Coligação Eleitoral CASA-CE.

Quanto à sua própria inelegibilidade, Adalberto, e de forma quase subtil, chutou para o Tribunal Constitucional essa mesma responsabilidade. “O Tribunal Constitucional quando legaliza as lideranças partidária verifica a nacionalidade originária e não se pode colocar em causa estas questões” advertiu Costa Júnior, acrescentando mesmo que é irresponsável o MPLA estar a fazê-lo.

Fim do gradualismo geográfico

O líder da UNITA teme que o fim do gradualismo constitucionalmente consagrado não signifique eleições em todos os municípios, porque a lei comum pode condicionar a existência de municípios elegíveis a outras questões, como, por exemplo, a autonomia financeira de cada município. Para Costa Júnior o Orçamento Geral do Estado tem de continuar a atribuir verbas ao poder local, até para combater assimetrias que de outra forma nunca serão eliminadas.

Comunicação Social

O líder da UNITA limita que a comunicação social no país esteja sujeita a um claro “problema de proporcionalidade” e lamenta que a ERCA seja incapaz de dirimir quaisquer conflitos, limitando-se a uma posição de omissão ou recomendação.

Adalberto adiantou que o seu partido tem dirigido inúmeras cartas aos directores dos órgãos de comunicação social do Estado e à entidade reguladora e que pondera recorrer mesmo aos tribunais.

Lamenta que a ERCA nem sequer consiga fazer prevalecer o direito de resposta. Lamenta igualmente a ausência de notícias da UNITA nas quatro televisões do Estado, nas diversas rádios e nos inúmeros jornais, tutelados pelo governo, e de “tesouras permanentes”, quando não mentiras, como foi o caso recente da Zimbo que noticiou que a sua equipa tinha sido obstaculizada na cobertura de uma conferência de imprensa da UNITA, quando na verdade chegou com 30 minutos de atraso, quando a conferência tinha terminado.

Adalberto Costa Júnior diz que os jornalistas de uma maneira geral desconhecem a pluralidade e que um país que não tem uma comunicação social livre é um país que não se desenvolve.

Por último divulgou que a TPA acompanhou a sua recente jornada no Uíge, da forma apoteótica como foi recebido, e disso mesmo transmitiu 28 segundos no principal jornal da estação.

Lamenta que os laboratórios de análise e propaganda, pagos com o dinheiro de todos os contribuintes, continuem ao serviço do poder. E afirma que, nesse aspecto, com João Lourenço a situação ainda está pior do que com José Eduardo dos Santos, também porque o actual Presidente gorou as expectativas iniciais, de maior abertura e mais liberdade de expressão e opinião.

O líder da UNITA considera que as redes sociais não substituem os órgãos de comunicação social tradicionais, mas diz que é o caminho possível para a oposição fazer passar a mensagem e que foram fundamentais para dar a conhecer ao país e ao mundo o que se passou em Cafunfo, em finais de Janeiro.

Pela actual situação da comunicação social responsabilizou o MPLA, que, recentemente, se recusou a debater o tema na Assembleia Nacional, rejeitando a proposta da UNITA para que tal fosse feito.

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