Não é fácil para o Governo pôr fim à política de subsídio dos combustíveis que os mantém a preços tão baixos que os analistas consideram que, em Angola a água é mais barata, mas o facto de o consumidor ter acesso a combustíveis baratos não significa que os custos de produção, no caso angolano, de importação sejam baratos, e cabe ao Governo pagar a diferença, o que nem sequer é muito democrático, uma vez que os que ganham mais pagam o mesmo dos que ganham o mesmo, e estes últimos precisam de ser apoiados em outras áreas como educação ou saúde.
Seja como for, o impacto social do fim da subsidiação dos combustíveis é tal, que não só se arrasta há anos, apesar da pressão dos parceiros internacionais como o Fundo Monetário Internacional para que se resolva, que divide o próprio Governo, como escreve o Expansão, que também acrescenta: “até porque o programa de transferências monetárias Kwenda está longe de atenuar o impacto da subida dos preços dos combustíveis”.
De acordo com o que apurou o jornal e a Camunda News pode confirmar, não está decidido se o processo arranca este ano, ou caso arranque, em que moldes será feito, mas os quase 3 mil milhões de dólares gastos na subsidiação em 2022 dão que pensar e obrigam a uma decisão, numa altura em que o OGE2023 está longe de responder com verbas no mínimo satisfatórias para o sector social, embora o Governo fale num “maior aumento”.
Sucessivamente adiado durante o programa de financiamento do Fundo Monetário Internacional (FMI), o início do processo para repor o valor de mercado dos combustíveis é encarado dentro do Ministério das Finanças como uma questão que tem de avançar em definitivo, preferencialmente este ano, mas nem todos os auxiliares do poder Executivo concordam com a ministra Vera Daves de Sousa, que volta e não volta, é vítima de ligeiras campanhas de difamação nas redes sociais – na verdade, isto anda tudo ligado.
É intenção dos MinFin arrancar o processo, mas outros ministérios e o ‘partido’ não estão de acordo e tentam empurrar o problema, como fazem em tantas questões, afinal, adiar é também um forma de governar, pensam alguns.
Há quem defenda que a retirada gradual dos subsídios deve ser feita num período mais curto de tempo, com maior impacto social, ou num período mais alargado, a vários anos, e com menor impacto social. Mas, acima de tudo, tem de se tomar uma decisão.
Há cerca de mês, a ministra das Finanças voltou a falar sobre o assunto e revelou que Angola estava a dialogar com o FMI e o Banco Mundial as compensações e as medidas de mitigação do impacto social adequadas para a remoção dos subsídios aos combustíveis, escreve o Expansão.
“O que estamos a fazer com essas duas instituições financeiras é analisar as possíveis medidas de mitigação que poderiam ser implementadas caso decidíssemos avançar, ainda não há decisão política relativamente a isso, o que está a acontecer é discussão e aprofundamento técnico dentro do tema”, disse Vera Daves de Sousa a propósito do assunto.
Ao que o jornal apurou, as medidas passam por estudar com as instituições multilaterais a possível criação de um programa de transferência de verbas monetárias para as populações mais vulneráveis, parecido com o Kwenda, mas destinado apenas a famílias que residam na periferia das maiores cidades – as mais afectadas pela eventual subida dos preços dos combustíveis, já que, por exemplo, é no centro de Luanda que estão a maior parte dos postos de trabalho formais do país. Para se ter uma ideia, um morador na zona dos Zangos gasta entre 1.000 a 2.000 Kz por dia para chegar à capital do país, valor que irá subir exponencialmente com o fim da subsidiação aos combustíveis.
O Expansão avança ainda com a informação que o Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE) está a liderar os estudos técnicos sobre o fim do programa de subsidiação. Este instituto, que de acordo como decreto presidencial n.º72/20, de 20 de Março, tem atribuído no seu estatuto a incumbência “de acompanhamento do processo de atribuição de subsídios operacionais e a preços, da execução da política de preços” terá de avaliar, por exemplo, a estrutura de preços juntamente com as associações de taxistas para definir o valor a cobrar por viagem a partir do momento que os preços dos combustíveis subirem.
“Há um longo histórico de compromisso assumido e depois falhado entre o Governo e as instituições multilaterais para o fim deste subsídio estatal que o Banco Mundial considera que, além dos contrabandistas, beneficia a camada mais rica da população, já que dos cerca de 80% dos combustíveis subsidiados adquiridos pelas famílias 40% são consumidos pelos mais ricos, sendo que apenas 7% são consumidos pelos 40% mais pobres. Fazendo contas, é fácil perceber, por exemplo, que um funcionário público em topo de carreira que more em Talatona e que se desloque diariamente para o centro da cidade paga menos a uma empregada doméstica do que o valor que poupa mensalmente em combustíveis devido à subsidiação estatal”, escreve o jornal.
O Governo acordou com o Banco Mundial o arranque da eliminação gradual dos subsídios estatais aos combustíveis no início de 2023, conforme era possível verificar no documento relativo ao financiamento de 500 milhões USD no âmbito do Programa de Crescimento e Inclusão (Growth and Inclusion Development Policy Financing). Não aconteceu, e Angola não é caso único, como a Camunda News já escreveu noutros artigos, aconteceu o mesmo com a Nigéria, que acabou por recuar na medida de pôr fim à subsidiação dos combustíveis, e a economia nigeriana, ao que tudo aponta, tende a crescer mais do que a angolana.